A cultura brasileira, diversificada e descompromissada, transita em múltiplas referências, permeada por vários sistemas culturais. A complexidade de materiais, suportes e narrativas que configuram o que é arte no Brasil revelam os contrastes e distanciamentos existentes entre os diversos discursos da arte na contemporaneidade. Os artistas brasileiros são caracterizados com frequência através de um olhar exótico e folclórico, que surge da dificuldade de se enxergar a inexistência de uma unidade cultural.
A ausência de uma formação profissional sistemática fez com que bienais e exposições internacionais se tornassem locais importantes de compartilhamento de crenças e valores estéticos, alargando as fronteiras do meio artístico. Frente ao academismo e o provincianismo latente, a importância da atualização da inteligência artística foi sempre uma grande preocupação dos artistas. Os movimentos de vanguarda europeus e americanos interviram de maneira decisiva na renovação da linguagem visual da arte brasileira, chamando a atenção ao que existia de autêntico e primitivo na realidade local.

Em um jogo abrangente de identidades, as diferentes realidades culturais que aqui convivem são as matrizes que absorvem e degustam os nossos sabores-saberes, onde, o pressuposto, somos todos iguais, é central ao se falar de arte, revelando cruzamentos e filiações. Misturar-se faz parte do que é ser brasileiro, é ser contaminado por diferentes experiências e referencias. Ausência de caráter? Nossas fronteiras históricas estão marcadas pelo atravessamento como troca cultural, o que selecionou, modificou e recombinou etnias tradicionais e aculturação predatória, imitação e inovação, contextos locais e periféricos, digitais e globais em suas produções artísticas.
Hoje o grande desafio não é só a tolerância, mas a aceitação, o compartilhamento e a convivência, uma poética da diversidade e não uma política de diferenças. A malícia nativa procura experimentar soluções outras como visão de mundo, colocando em crise a ideia de raízes, tradições e autenticidade; mesmo o conceito de nação é colocado de lado nas designações sobre arte. A compreensão dos cruzamentos e da simultaneidade, do jogo de combinações e do sincretismo, contamina as escritas lineares da arte de desordem e de desvios em suas significações. A ideia dessa coletânea de obras é promover a interação e o entendimento do eclético, sem tropeçar em critérios ou julgamentos estéticos.